20160705

Etimologia de Adoração



A acepção encontrada nos dicionários traz por certo que adorar e cultuar são, de alguma forma, sinônimos. O Novo Dicionário Aurélio – Século XXI, Edição Eletrônica, 1999, traz as seguintes definições: Adorar v.t. 1. render culto a (divindade). 2. Amar extremosamente. No mesmo dicionário, a definição de culto, é: Culto sm. 1. Adorar ou homenagear à divindade em qualquer de suas formas e em qualquer religião. 2. Modo de exteriorizar o culto, ritual. 3. Veneração, preito. É claro que essas definições apenas mostram que os termos se misturam e que se igualam a ideia do senso comum, “adorar a Deus é prestar-lhe culto”. Entretanto os termos são mais complexos e exigem maior reflexão.

No Novo Testamento a palavra que foi traduzida por adorar significa render-se. O termo προσκυνεῖν e suas origens comuns, aparecem 58 vezes, sempre com o sentido de submissão. O termo, em sua etimologia, tem o sentido de “beijar os pés” ou prostrar-se diante de alguém superior, submeter-se, colocar-se a disposição de outro.


Existem na Bíblia mais de 5 mil termos associados a algum serviço religioso, culto ou celebração, sinalizando dentre outras coisas a importância bíblica dada à temática culto/adoração. Isso mostra que os autores entendiam a adoração associações a outros termos que são válidos e imprescindíveis para uma compreensão bíblica verdadeira. Uma delas é que adorar está ligado ao servir ou serviço, (λατρείαν), que quando juntada ao vocábulo culto (vide definições aurelianas acima) que vem do latim, cultus, dá sentido a comentar primeiramente o termo λειτουργίας, que origina o vocábulo liturgia, antes de tratar propriamente da λατρείαν (serviço). Composta de duas palavras gregas, “povo” (λαῶν) e “trabalho” (ἔργον), λειτουργίας, que significava originalmente pagar sozinho as despesas de um trabalho público, cerimônia ou benfeitoria, voluntariamente ou por obrigação. Entretanto a palavra liturgia, no contexto atual, traz apenas a ideia de cerimônia ou organização cúltica, um cronograma religioso. Na verdade o termo está destituído de seu verdadeiro sentido.

No N.T. o apóstolo Paulo usa naturalmente o termo λειτουργὸν para descrever-se como ministro de Cristo, missionário aos gentios (Rm 15.16). Os líderes da igreja de Antioquia adoravam (λειτουργούντων) ao Senhor (At 13.2) por intermédio de oração, jejum e no ensino à igreja. A ajuda aos carentes da igreja de Jerusalém é chamada de λειτουργίας (II Co 9.12). O sacro ofício de Jesus Cristo é um ministério superior (λειτουργίας) (Hb 8.6). É correto afirmar que os cristãos cumprem uma “liturgia” quando trabalham pelo bem de seus irmãos, a exemplo de Cristo (Jo 3;4 a 14). O N.T. mostra, em diversos textos, que adoração genuína é “trabalhar” para Deus (At 13), consequentemente trabalhar para ou na Igreja.

Já o termo λατρείαν surge de λατρων (ordenado) no grego secular foi usado para indicar um trabalho pago e, mais tarde, um trabalho não pago, ou escravo (em hebraico ou δοῦλος em grego). Acrescentando ao conceito de adoração a ideia de uma relação serviçal entre o homem e divindade. Esse termo, reconhecido facilmente no vocábulo “idolatria” (serviço, devoção ou culto a um ídolo), em Atos 7:42, foi utilizado para descrever a atitude de certos israelitas rebeldes que cultuaram (λατρεύειν) as hostes do céu.

Paulo afirma que são os demônios que dão realidade ao culto (λατρεύειν) a ídolos (I Co 10.20), e que Deus re¬vela Sua ira contra todos os que idolatram a criatura (Rm 1.25). O termo também é empregado em contextos positivos. Paulo utiliza-se de λατρείαν, “culto”, para a ideia de serviço santo e agradável (Rm 12;1), vemos o termo ser usado na passagem aonde profetisa Ana servia (λατρεύουσα) ao Se¬nhor no Templo, numa adoração de jejuns e orações (Lc 2.37), bem como em Hebreus 8;5, 9;9, 10;2, 13;10, se referindo ao culto judaico no Templo. No evangelho segundo Mateus, Jesus, também usa o termo λατρείαν pa¬ra responder ao diabo (4;10) afirmando que somente Deus era digno desse serviço. Em Apocalipse, o apostolo João descreve uma multidão que serve ou adora a Deus (λατρεύουσιν) incessantemente (Ap 7;15). A λειτουργίας, em que Jesus se ofereceu foi para que os adoradores tivessem consciências limpas para poder servir (λατρεύειν) ao Deus vivo (Hb 9;14).

De fato, as ideias associadas aos termos adoração e culto, estão mais ligadas ao estado em que adorador se apresenta a Deus do que onde e quando ele apresenta ao Senhor. Embora no vernáculo os termos adoração, culto, liturgia, serviço religioso, reverência e religião, acabaram se misturando e no senso comum eles são considerados sinônimos, é correto afirmar que a cerne da ideia religiosa de reverência cúltica biblicamente estabelecida (lê-se adoração bíblica) é apropriadamente ligada a uma relação de escravo e senhor, essa relação é bastante significativa para definir a adoração que devemos prestar a Deus. Submissão e serventia são as definições mais acertadas para a adoração.

Fonte: acruzonline.blogspot.com